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Artigo: Crimeia e a ‘Ilha-Mundo’

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Por Marcos Troyjo

Jogo de soma zero — expressão utilizada em relações internacionais para demonstrar que quando um país perde com determinada ação outro necessariamente ganha. Como no basquete, não há empate, só vencedores e vencidos.

A vertiginosa crise na Ucrânia foge a essa regra. O cabo-de-guerra entre Rússia e Ocidente é um jogo de soma negativa. Ninguém ganha. O impasse na Crimeia colocou bodes na sala das principais potências e organizações internacionais.

Perde a Ucrânia. Ronda o espectro de desmembramento maior do que apenas a própria Crimeia. Aflora o ódio subcutâneo entre ucranianos do Oeste e russos, farta matéria-prima para novos conflitos.

Perde a União Européia. Em meio à frágil recuperação econômica, é forçada a mostrar-se presente nos países do Leste. Sua incipiência geopolítica na Ucrânia já fora saudada com um “dane-se a Europa” por graduada diplomata americana. O Reino Unido quer imposição de sanções econômicas à Rússia; a Alemanha as descarta. Bruxelas emite sinais dúbios, que em nada sugerem uma “União”.

Perde a OTAN. Num tabuleiro em que o antagonista porta armas nucleares na cintura, não pode dar-se ao luxo de cogitar o emprego de forças convencionais, como fez nas Crises dos Balcãs nos anos 90.

Perde a ONU. Dado o poder de veto da Rússia, seu palco privilegiado — o Conselho de Segurança — não adotará resoluções para remediar a crise. Esta, ao contrário da diplomacia multilateral, convida à costura de alianças pontuais — a “Balança de Poder” — típica do teatro europeu do século 19.

Perdem os EUA. Terão de reverter tendência à retração de sua política exterior, além de revisar para cima o orçamento de defesa. Tensões como a Crimeia exigem custosa diplomacia e poder de dissuasão, não drones confortavelmente pilotados por controle remoto.
Perdem Rússia e seus aliados. Além do isolamento político, caso o impasse no Leste se prolongue, a Rússia experimentará deterioração de seu status como economia emergente e flertará com o derretimento de sua bolsa de valores. Na presente conjuntura, ladear-se com a Rússia implica sujeitar-se ao “diga-me com quem andas e te direi quem és”.
Perdem os nostálgicos da Guerra Fria. A União Soviética não ressuscitará como alternativa. A Rússia não busca reedição de um império. Vela apenas para que a OTAN não finque pé em seu entorno, o chamado “Near Abroad”. Moscou tem projeto para si, não uma cosmovisão.

Só pode haver um ganhador: o vulto do inglês H.J. Mackinder, pai da Geoestratégia. Há exatos 100 anos, apresentava à Royal Geographical Society o presciente artigo “O Pivô Geográfico da História”. Nele, conceituava a gigantesca massa de continentes formada por Europa, Ásia e África como “Ilha-Mundo”, cujo “Heartland” tem epicentro na Europa Oriental.
Anos depois, Mackinder resumiria sua teoria numa lógica que imantou duas guerras mundiais — e hoje volta a assombrar: “Quem domina a Europa Oriental comanda o Heartland; quem domina o Heartland comanda a Ilha-Mundo; quem domina a Ilha-Mundo controla o mundo”.
Artigo publicado na Folha de S. Paulo

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