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“Nos interessa o diálogo com o eleitorado petista”, diz presidente do PSOL

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Luiz Araújo nasceu em Belém do Pará. É professor, historiador, doutorando na USP, egresso da escola pública ‘a vida inteira’, faz questão de lembrar. Começou sua militância política aos 14 anos de idade. A estreia vem de uma luta antiga, embora continue atual: ‘Fui da liderança do movimento secundarista na luta pela meia passagem, hoje o passe-livre’.

Apesar de menor de idade, aos 16, ajudou a fundar o PT do Pará – a ficha foi a de nº 313 – e em 1983, aos 20 anos, estreou como professor na Rede Pública de ensino.

A vida política se iniciou em 1992, eleito vereador, mandato que o alçou à Assembleia Legislativa dois anos depois – quando Fernando Henrique Cardoso iniciava seu governo em Brasília. Licenciou-se do cargo eletivo e foi nomeado Secretário de Educação da Prefeitura de Belém, na gestão de Edmilson Rodrigues (PT). Mudou-se depois para Brasília e passou pelo INEP – onde ocupou a presidência por oito meses durante o primeiro governo Lula.

Araújo é da segunda leva de petistas que trocou o partido pelo PSOL. Filiou-se em 2005. Da cota pessoal de Randolfe Rodrigues, agora pré-candidato confirmado à Presidência, Araújo – que já ocupava a Executiva – foi eleito presidente na Convenção de Novembro.

Nesta entrevista à Coluna, ele detalha como vai comandar o partido no ano crucial de eleição presidencial, lembra acertos e erros da fundadora Heloísa Helena, defende maior participação do Estado na economia, critica a atuação seletiva do BNDES e prevê que a revolução de Junho passado nas ruas dará um recado nas urnas. Adianta ainda que o PSOL quer fazer uma bancada maior na Câmara e que trabalhará para conquistar o eleitor petista insatisfeito. “Nós surgimos e ao mesmo tempo somos vítimas da falência do PT”.

Como dá conta de conciliar a agenda?

Eu sempre fiz várias coisas ao mesmo tempo, mas eu tive uma sobrecarga muito grande porque eu estava em dois empregos, mais o doutorado, mais a executiva nacional do PSOL e acompanhando a prefeitura de Macapá, para onde eu ia uma vez por semana no primeiro semestre. O meu planejamento era ficar num emprego só, trabalhando como professor, que é o que eu gosto de fazer, e agora na executiva nacional do partido. Eu acho que no ano que vem vai ser aparentemente mais tranquilo em termos de quantidade de trabalho.

O que te motivou a ir para o PSOL?

A falência do projeto do PT. Nós somos um grupo que está desde o início, desde a década de 80 dentro do PT. Mas nós éramos um grupo que já existia na época da Ditadura e que ajudaram a fundar o PT e lutaram dentro do PT para que ele tivesse um projeto voltado mais para a esquerda. E nos sentimos muito representados por um programa que o Lula apresentou em 89, por exemplo. E esse programa foi se perdendo durante esse processo.

Em qual área o PT mais se afastou de seus projetos originais?

Eu acho que pra chegar ao Poder o PT mudou o seu programa pra compor com segmentos do empresariado brasileiro. O símbolo maior pra fora foi a carta aos brasileiros que o Lula apresentou em 2002, que era uma série de compromissos para manter a mesma política econômica que nós combatíamos para, digamos assim, não ter mais uma oposição serrada do empresariado, dos bancos, das grandes empresas e corporações. Mas não foi um gesto que começou a ser construído ali, foi uma mudança programática que foi perdendo as energias de mudança.

Você acha que aquele gesto da Carta aos brasileiros, na véspera da eleição, foi o divisor de águas do PT?

Ela consolidou uma visão que já estava majoritária no partido, mas que não se assumia plenamente. Havia uma tensão interna, tanto que nós ficamos dois anos e meio no PT pós-eleição porque a gente achava que esse sentimento de mudança estava muito presente na militância do PT, nos quadros partidários e não estava consolidada aquela visão ali na Carta.

O PSOL parece que, gradativamente, está passando por essa mudança. 

Eu não acho que são processos comparáveis. O PSOL nasceu da falência do PT. Só existe o PSOL por essa guinada que o partido deu. Nós surgimos e ao mesmo tempo somos vítimas da falência do PT, a gente é vítima porque o espaço para a esquerda diminuiu. A mudança que tem ocorrido tem a ver com o que aconteceu no PT. Quem se consolidou no PSOL é uma maioria que acredita que é necessário você ter uma posição programática em relação ao governo, ao tripé econômico e a política econômica que nós temos. Há uma rebeldia muito grande que tem atraído a juventude para o PSOL, e essa rebeldia continua presente, mas o PSOL não tem na sua essência uma vocação para ser uma seita. O PSOL é um partido de massa, um partido democrático, mas que resgata o ideário socialista. A Heloísa Helena se tornou uma liderança nacional no meio da crise do mensalão do PT, de 2005 a 2006, então capitalizou essa insatisfação, essa desilusão. Ela não aceitou ser candidata em 2010 e defendia que a gente apoiasse a Marina.

E agora? Por que ela não é candidata?

A Heloísa está no PSOL no momento porque o partido da Marina (Silva, a REDE) não deu certo. Ela e outras pessoas, inclusive alguns fundadores do PSOL, iriam sair. Ela foi uma das assinantes da ata da Rede. Os caminhos foram muito distintos, porque depende dos interesses locais. A Heloísa não foi expulsa do partido e tem uma relação muito boa com o PSOL em Alagoas, então ela avaliou que não precisava sair.

Mas o que faz a própria fundadora do PSOL querer sair do partido?

Na minha opinião a Heloísa aparentemente seria mais radical do que a gente, mas a opção dela de ir pra Rede mostrou o inverso. Eu respeito a opinião dela, eu acho que quando ela viu que tinha outros setores ganhando força no partido ela resolveu se fechar e se abster da liderança nacional.

Então ela perdeu o controle do partido?

Eu acredito que ela não ter uma maioria sólida em torno dela e não ter concordância do que defendia em 2010, ela se recolheu em Alagoas e abdicou de disputar nacionalmente. Eu acho que ela errou porque nós do PSOL dependíamos dela para ser candidata à Presidência.

Foi aí que o Plínio de Arruda apareceu?

Nós fizemos um Congresso do PSOL e grande parte dos participantes queria que a Heloísa fosse candidata e ela não quis. Nós discutimos no Congresso o que fazer, depois de muitas discussões e outras candidaturas, nós optamos pelo Plínio. Era uma candidatura que não tinha a mesma potencialidade que ela tinha. Nós abrimos mão da disputa porque não tínhamos um nome para disputar a eleição no nível que a Heloísa disputaria. Acredito que tinha muito a ver também com a amizade dela com a Marina, tanto que ela fez campanha para a Marina e não para o Plínio.

E isso não pegou mal para o PSOL?

Teve um desgaste. A postura da Heloísa em relação a amizade dela com a Marina é óbvio que desgasta.

A Heloísa é pré-candidata ao Senado. O apoio a ela é por obrigação?

Não, é um pouco diferente nesse caso. Nós vamos dar a legenda para ela se candidatar pelo PSOL. Eu sou favorável que a gente dê a legenda mesmo sabendo que a probabilidade de ela migrar para a Rede no dia seguinte é grande. É muito melhor que a Heloísa seja candidata ao Senado em Alagoas do que um Collor de Melo ou qualquer outro da Direita. Então, para o povo brasileiro e para os alagoanos é muito importante, porque negar a legenda à Heloísa não ajudaria em nada os brasileiros.

Quais são as suas prioridades agora no partido?

A minha prioridade é consolidar e iniciar desde já a organização da campanha do Randolfe.

Você pretende viajar a todos os diretórios estaduais?

Eu já fui secretário geral, estive nas executivas, estou acompanhando, então eu não precisaria ir aos Estados. Mas, nós vamos fazer uma rodada de visitas para organizar a campanha, porque a campanha tem duas pontas: uma vai resolver as questões da campanha presidencial, que já está decidido que será o Randolfe. Já temos um nome, falta apenas um programa e acertar as estruturas da campanha. Que é difícil por ser uma campanha de esquerda de um partido pequeno. A segunda ponta que a direção precisa se dedicar é que temos outra prioridade, que é eleger uma forte bancada. E uma forte bancada se elege por boas chapas nos Estados. Ter chapas majoritárias boas nos Estados e chapas competitivas para disputar a Federal é uma prioridade para o PSOL.

No Amapá o PSOL está muito bem. O Estado está dando o recado de que o cenário pode mudar no país?

Eu acho que o maior prejudicado e o nosso maior adversário no dia seguinte da vitória do senador Clésio na capital é o Sarney. Ele e o grupo político. Eu espero que esse exemplo de afastar as velhas oligarquias do Poder que aconteceu em Macapá se espalhe pelo Brasil todo. A candidatura do Randolfe encarna outro componente em nível nacional, que é essa questão de que há um sentimento de mudança no Brasil. É obvio que nós temos imensas dificuldades, nós somos um partido pequeno.

Como vocês administram o partido?

Fazendo milagres. O partido é pequeno, uma parte do partido é militante. O que sustenta o partido não é o fundo partidário, que sustenta a Sede Nacional. Os parlamentares têm contribuição regular no partido, mas é uma penúria, então a máquina partidária é muito pequenininha. O que garante isso é que tem uma presença social, que o PT já teve no passado, em que se fazem eventos, mobilizações e muito voluntariado.

Quais as bandeiras?

Uma mudança radical na política econômica. A primeira é uma mudança no tripé da política econômica. A nossa bancada na Câmara fez uma CPI da dívida e detectou várias irregularidades que mereceriam uma auditoria, mas ninguém quer mexer na dívida, porque não podem mexer com os banqueiros do Brasil. Metade do orçamento federal é gasto com isso no Brasil. Então, uma auditoria da dívida, uma revisão do superávit primário e um redirecionamento. Hoje o setor financeiro especulativo governa o Brasil e consome as riquezas nacionais. Criticam muito o investimento em infraestrutura, mas ninguém quer mexer no superávit primário. Segundo, uma maior presença do estado brasileiro na vida econômica do país.

Isso passa essencialmente pelo fortalecimento do BNDES ou tem outras opções que vocês podem propor?

Nós vamos redirecionar o BNDES para os investimentos produtivos.

Quer dizer democratizar?

Democratizar e investir na infraestrutura. O problema é que o BNDES está sendo usado como fonte de subsídio para as privatizações. Não somos contra, mas vamos rever as privatizações. E a primeira delas é o modelo de leilão que foi feito no pré-sal. Nós não podemos impedir o governo de fazer algum leilão, mas certamente no governo do Randolfe não teria leilões e a Petrobras seria fortalecida.

Então vocês são contra todas as concessões em todas as áreas?

Exatamente! Nós somos favoráveis a voltar ao monopólio da Petrobras. É necessário fazer uma revisão completa e um redirecionamento dos investimentos para criar as bases de presença do Estado nas áreas fundamentais de educação, saúde, mobilidade urbana e saneamento básico, que gera emprego, gera renda e gera negócio no país. Então, uma parte do investimento produtivo significa fazer investimento em infraestrutura para diminuir as doenças, gastar menos com saúde, ter um padrão mínimo de qualidade. Porque o dinheiro não é infinito, é necessário fazer opções.

Quando que o PSOL vai preparar um plano de governo para o Randolfe?

Nós vamos iniciar agora um processo de construção coletiva, porque nós queremos ouvir todos os setores sociais que questionam a política econômica do governo, ou seja, a esquerda que não é do PSOL.

Nesse grupo pode até ter grandes empresários, vocês vão chamar também?

Na hora que nós formos discutir o investimento produtivo não tem nenhum problema de ouvir os empresários. Só que é uma relação diferente, nós não queremos um governo que aceite lobby ou propinas. Pequenas e médias empresas serão beneficiadas na hora de discutir licitações.

Vocês vão usar na TV os modelos de prefeituras em campanhas para mostrar que a proposta do PSOL pode dar certo?

Sim, nós vamos buscar essas experiências. Nós não vamos apresentar um programa que é para quem vai fazer uma revolução. Vai ser um programa radicalmente diferente do apresentado por outros partidos, mas concreto. Não vamos prometer aquilo que não faríamos.

Quais são os partidos aliados para a campanha presidencial do PSOL?

Nós vamos procurar o PCB, mas a nossa maior preocupação não é com os partidos formais. Eu acho que o aprendizado que nós tivemos com as manifestações de Junho é que há um cansaço da população com a forma de fazer política no país. O antipartidarismo que apareceu não é uma negação aos partidos, mas é com o tipo de partido que a gente tem. A esquerda também sofreu com isso, porque simbolizava a política como ela é. O político corrupto, o que não resolve os problemas do povo.

Então o Randolfe pretende preencher essa lacuna?

Nós vamos trabalhar para dialogar e mapear esses segmentos sociais beneficiados e interessados com o programa que a gente está apresentando. Então, o nosso programa responde a essas demandas, mas pode ser que a gente não conquiste as pessoas e elas continuem com a crise de identidade, por exemplo, lutando contra a Belo Monte e votando no PT. Não nos interessa nenhum diálogo com o PT, mas nos interessa o diálogo com o eleitorado petista.

Vocês acham que podem conquistar os petistas descontentes?

Sim, dos insatisfeitos. Essa insatisfação é muito misturada. Eu me lembro que uma parte das pessoas que eram antipestistas eram muito conservadoras com a campanha da Heloísa. E votaram nela em protesto.

O senhor acredita que esse voto de protesto vai se repetir com o Randolfe, como aconteceu com a Heloísa e até com a Marina?

A Marina e a Heloísa captaram parte das pessoas que gerou as manifestações agora em Junho. Essa insatisfação latente, digamos assim. No caso do Randolfe, ele disputa esse eleitorado que cresceu. É o eleitorado que a Marina conquistou e que cresceu com as manifestações. É uma parcela conquistada. Nós vamos nos esforçar para dialogar com eles, pois não depende só da gente. As nossas verbas são limitadas, não temos estrutura para dialogar com eles nem tempo na televisão, então nós vamos começar mais cedo, ser mais criativos. Acredito que temos uma vantagem pelo fato de que estamos mais preparados para dialogar com a juventude que está nas redes sociais do que as outras candidaturas. O fato de ser um candidato jovem e ter ideias novas e também o fato de apresentar um programa que dialogue com esses segmentos organizados e com as demandas de Junho que vão voltar.

O Randolfe está investindo nesse público também?

O público-alvo da campanha são os insatisfeitos. Logicamente, outros candidatos também vão tentar conquistar esse público. O problema é que talvez eles não consigam se “desgrudar” da velha política que esses jovens enxergam.

Colaborou Luana Lopes

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